Nos bastidores da fé

Blog de crítica ao teísmo, em defesa do racionalismo e da ciência. Pretende abordar assuntos sob o tema "deus" e suas idiossincrasias.


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terça-feira, julho 27, 2004


Acabei achando sem querer um dos maiores aglomerados de falácias divinas que já vislumbrei em toda minha vida. Há trechos antológicos, como esse:

"Não existe um argumento conhecido por nós que, como argumento, leve a uma conclusão provável (altamente provável). Por exemplo, acredita que o sol irá levantar-se amanhã cedo, mas se fôssemos analisar as evidências, os argumentos que levam a essa conclusão, seríamos for que eles, por melhores que sejam, são caracterizados pela probabilidade. Os argumentos teístas não são uma exceção à regra de que todos os argumentos indutivos sobre o que existe são argumentos de probabilidade. Este é o ponto em que os argumentos, afirmam chegar."

A falácia é tão sem noção que fica quase irrefutável, hehehe.

Para quem ficou com água na boca, cá está o link:
http://www.erdos.com.br/estudos/argumentosqueprovamaexistenciadedeus.html
# posted by Delerue @ 7:40:00 PM  ::  




E aqui o insano autor (já nosso fã, hehehe) desse prosaico texto teísta encerra sua brilhante conclusão.
Obs.: um pequeno destaque logo abaixo (em negrito) para um riso mais saboroso. ;)

5ªA crença de que Deus existe é praticamente tão difundida quanto a própria raça humana, embora muitas vezes se manifeste de forma pervertida ou revestida de idéias supersticiosas. A maior parte dos ateus parece imaginar que um grupo de teólogos se tenha reunido em sessão secreta e inventado a idéia de Deus, apresentando-a depois ao povo. Mas os teólogos não inventaram a Deus como também os astrônomos não inventaram as estrelas, nem os botânicos as flores. È certo que os antigos mantinham idéias erradas acerca dos corpos celestes, mas esse fato não nega a existência dos corpos celestes. E visto que a humanidade já teve idéias defeituosas acerca de Deus, isso implica que existe um Deus acerca do qual podiam ter noções erradas.

Eis em suscintas palavras os argumentos que podemos aduzir. Não fique porém, a impressão de que a existência de Deus depende de uma demonstração racional. Nem para provar todas as coisas podemos usar o método científico. Há uma ciência muito mais profunda que precisamos aprender: a ciência da fé.

Champlin conta que certa feita, estava pregando em uma igreja batista sobre as provas da existência de Deus. ?Procurei usar algumas poucas referências bíblicas que concordam em espírito com as provas filosóficas, mas que não se acham ali com o propósito específico de provar a existência de Deus. Fui severamente criticado devido aquele sermão, e uma da senhoras chegou a dizer: "Espero que o pastor não torne a convidar aquele filósofo para falar à igreja!". Em uma outra ocasião, um jovem de um seminário batista, na cidade de São Paulo, referiu-se ao que aquela senhora dissera, concordando inteiramente com ela. Eu estava presente e ouvi a observação dele, mas não me dei ao trabalho de protestar. Mas eu sabia que tanto os cursos de filosofia como teologia (da escola que ele freqüentava) incluíam a existência de Deus, naquelas disciplinas. A ignorância dos fatos nunca leva a coisa alguma. Quanto mais aprendemos, tanto melhores ficamos. Os filósofos têm feito bem em examinar esse assunto: fazemos bem em ficarmos informados acerca do assunto. - mesmo que não precisemos de tais provas para consubstanciar a nossa fé cristã. Pois os que ainda pertencem ao mundo, talvez sintam que essas provas são úteis para eles consubstanciarem sua fé na existência de Deus. Outrossim, muitas dessas provas têm uma sólida base bíblica, ainda que, na Bíblia, tais conceitos não sejam expostos como provas.
# posted by Delerue @ 7:24:00 PM  ::  




segunda-feira, julho 26, 2004


Ok, é um off-topic, mas não consegui resistir. :)

Uma Matéria Especial na edição atual do Skeptical Inquirer dá uma olhada no mais radical protesto já feito por um grupo de céticos. Eles contestaram uma decisão pelas principais companhias de seguro se saúde da Bélgica de começar a cobrir os custos de tratamentos de homeopatia em resposta à demanda popular. Deprimidos pela disposição das companhias de seguro em encorajar o charlatanismo, os 23 céticos se resignaram a um suicídio em massa bebendo um coquetel de venenos letais incluindo arsênico, veneno de cobra e a mortal beladona. Para o horror dos homeopatas, eles ainda aumentaram a potência dos venenos na mais verdadeira moda homeopática preparando uma solução 30C do coquetel. Isso significa que o coquetel foi diluído uma parte por cem e chacoalhado, o que foi então repetido consecutivamente 30 vezes. Todos os jornais e estações de TV foram convidados a assistir a agonia de morte dos 23 suicidas, que incluíram vários cidadãos proeminentes e professores de medicina, "e algumas pessoas normais armadas apenas com bom senso." A cobertura da mídia foi excelente, mas a tentativa de suicídio resultou em um fracasso.

[Fonte: APS, via Skeptical News]
http://www.liquito.blogger.com.br/2004_05_01_archive.html#27111611
# posted by Delerue @ 7:11:00 PM  ::  




sábado, julho 24, 2004


4. Apenas de um criador inteligente poderia derivar-se o universo. Não por acidente que os planetas, os sistemas solares e galáxias, giram cada qual em sua órbita, harmonicamente e guardando entre si relação perfeita; não é por acidente que 107 elementos químicos, diferentes, se combinam, se ligam uns aos outros, nas mais variadas formas, dando origem a todo tipo de matéria encontrada na natureza, não é por acidente que na fotossíntese, as plantas clorofiladas utilizam a luz solar, o dióxido de carbono, a água e os minerais para liberar oxigênio e produzir alimentos, e poderíamos ir mais além, demonstrando por meio sólidos e irrefutáveis argumentos que a ordem natural nao foi inventada pela mente humana? A existência da ordem pressupõe a existência de uma inteligência organizadora. E essa inteligência não pode ter sido outra senão Deus.
# posted by Delerue @ 11:22:00 AM  ::  




segunda-feira, julho 19, 2004


Pra quem gosta de falácias, essa seção é um prato feito. :)

3. Entre os povos mais avançados até os mais primitivos e degradados da terra podemos encontrar neles consciência, isto é, a faculdade de aprovar ou condenar ações numa base moral. Diz Paulo: "Os gentios, que não tem lei, fazem por natureza as coisas da lei, eles embora não tendo lei, para si mesmos são lei. Pois mostram a obra da lei escrita em seus corações, testificando juntamente a sua consciência e os seus pensamentos, quer acusando-os, quer defendendo-os." Romanos 2:14,15. Naturalmente a consciência das pessoas que se encontram longe de Deus, acha-se contaminada, obliterada, cauterizada (I Timóteo 4:2; Tito 1:15), sendo-lhe necessário ser purificada pelo sangue de Cristo (hebreus 9:14; 10:2-10,22). Por mais insensibilizadas que sejam suas consciências, porém, todos os homens possuem um senso comum do direito e do errado, não apenas causa de ensinos morais que tenham recebido, mas porque, como declarou Immanuel Kante, grande filósofo alemão, "há dentro de nosso interior a lei moral". "Há entre os gentios, almas que servem a Deus ignorantemente, a quem a luz nunca foi levada por instrumentos humanos? Conquanto da lei escrita de Deus, ouviram sua voz a falar-lhes por meio da natureza, e fizeram aquilo que a lei requeria." A existência de uma lei implica a existência de um legislador. Foi Deus quem idealizou uma norma de conduta para o homem e a escreveu na mente humana.
# posted by Delerue @ 10:40:00 PM  ::  




domingo, julho 18, 2004


2. A CRIAÇÃO ANIMADA ATESTA A EXISTÊNCIA DE DEUS.(Romanos 1:20)
Embora exista uma enorme diversificação de seres vivos, o padrão biológico é essencialmente o mesmo, apresentando apenas diversos graus de simplicidade ou complexidade orgânica. Esta é uma forte evidência de que todos os seres vivos procedem de um mesmo projeto. Está hoje demonstrado cientificamente que a vida só procede de uma vida preexistente. Todos os avanços da nova ciência médica e cirúrgica no tratamento e prevenção de doenças infecciosas baseiam-se nesta grande e inegável lei da biogênese. Ao consultarem o que poderia ser chamado de livro da criação divina, os cientistas são forçados a reconhecer que uma vida maior deu origem a todos os seres viventes. "Não há a mais leve evidência de que a matéria possa surgir de matéria inanimada." (Prof. Conn). Deus criou a vida, Ele é a fonte de vida. "Nele nos movemos, vivemos e existimos." Atos 17:28. Cada respiração, cada pulsar do coração é uma prova do cuidado de Deus. É também dele que depende tudo, desde as mais rudimentares formas de vida até as mais complexas. Não existe outra maneira de explicar a presença de vida sobre a terra. A realidade inevitável do poder e complexidade da criação macroscópica e microscópica aponta, sem dúvida para Deus.
# posted by Delerue @ 3:17:00 AM  ::  




quinta-feira, julho 15, 2004


Tudo bem, acho que seria justo colocar aqui também alguns (pseudo) argumentos teísta (ops, não resisti). Aqui vai um dos que tenta provar a existência de papai do céu, dentre outros quatro argumentos. Vejamos então a seção:

CINCO EVIDÊNCIAS DE QUE DEUS EXISTE
Podemos encontrar pelo menos cinco evidências racionais da existência de Deus:

1. A CRIAÇÃO INANIMADA ATESTA A EXISTÊNCIA DE DEUS.(Salmos 19:1-2)
Crer que o universo surgiu por acaso faz tanto sentido quanto crer que os livros se formam sozinhos pelas leis da soletração e da gramática. Quando se vê uma bela casa logo se pensa em quem construiu. Se alguém lhe dissesse que ela não foi construída por ninguém, mas que simplesmente apareceu ali, acreditaria nisso? É claro que não. Como disse certo escritor: "porque toda casa é construída por alguém." É uma afirmação óbvia. Todos concordam, então por que não aceitar a conclusão lógica a que chegou o mesmo escritor bíblico: "Mas que edificou todas as coisas é Deus". Hebreus 3:4. Qualquer um que tenha bom senso terá de, mais cedo ou mais tarde, admitir a necessidade da existência de um criador. O princípio da causalidade mesmo certifica que todo fenômeno tem uma causa. Esta é uma verdade incontestável, a existência de uma causa primária! Albert Einstein, o maior físico do século XX, admitiu: " Para mim basta meditar na maravilhosa estrutura do universo a nós vagamente perceptível, e tentar compreender humildemente nem que seja uma infinitésima parte da inteligência manifesta na natureza."
# posted by Delerue @ 11:41:00 PM  ::  




domingo, julho 11, 2004


# posted by Delerue @ 11:33:00 PM  ::  




quarta-feira, julho 07, 2004


Continuando e finalizando o texto do Matheus.

Alguns conflitos entre a fé e a razão

Mas será mesmo que os domínios da fé e da investigação racionais podem estar tão nitidamente demarcados? Recentemente dois biólogos renomados, Stephen Jay Gould e Richard Dawkins, entraram numa polêmica sobre essa questão. Para Gould, ciência e religião se constituem em "Magistérios Não Interferentes". Segundo ele, o magistério da ciência representa o conhecimento factual do mundo natural enquanto o magistério da religião trata dos desígnios do homem e sua conduta moral ou ética. A partir disso, ele pretende demonstrar que só há conflito entre ciência e religião quando uma tenta invadir o território da outra e afirma veementemente que: "A ciência e a religião não estão em conflito, pois seus ensinamentos ocupam domínios completamente distintos. (...) Eu acredito, de todo coração, em um pacto respeitoso, até mesmo amoroso (...)?. Gould (citado por Dawkins, 1998).

Com isso ele sugere claramente que ciência e religião não precisam se abrigar sob o mesmo esquema de explicação ou análise porque não disputam o mesmo "pedaço" de verdade, e mostra vários exemplos ao longo da história de muitos religiosos que defenderam fervorosamente o método científico. Esses afrontamentos entre religião e ciência são menos freqüentes do que se imagina, e, se eles ocorrem, é devido a uma incompreensão de ambas as partes sobre o seu próprio papel a ser desempenhado. Stephen Jay Gould é qualificado para falar sobre o assunto, pois participou de uma guerra judicial em 1987, entre criacionistas e evolucionistas, em que os primeiros, representados por líderes religiosos, exigiam tempos iguais nas escolas públicas americanas para o ensino da teoria da evolução de Darwin e do texto bíblico do Gênesis.

Já Richard Dawkins discorda radicalmente deste pensamento. Para ele, esses dois domínios não possuem objetivos completamente distintos, o que torna absurda a idéia de "Magistérios Não Interferentes". Cabe aqui repetir a distinção que Gould faz dos objetivos da ciência e da religião: "A rede da ciência cobre o universo empírico: de que é feito (fato) e porque ele funciona dessa maneira (teoria). A rede da religião se estende sobre questões de significado e valor moral" (Ibid. Ibidem). Vamos ignorar essa afirmação de que a religião tem conhecimentos especiais a nos oferecer em questões morais, o que para o próprio Dawkins é uma esperança vã, visto ser impossível uma moral de valores absolutos servir como um alicerce, e voltemos para a questão central. As afirmações religiosas estão distantes do domínio da ciência?

Dawkins cita como exemplo a Igreja Católica e argumenta que ?a rede do Catolicismo não está limitada às considerações morais, tão somente porque a moral Católica tem implicações científicas" (http: //www.str.com.br/scientia/gramado.htm) (Dawkins, 1998, p 4). Ora, a moralidade católica exige, por definição, que haja um golfo intransponível entre o Homo sapiens e o resto do reino animal. Exigência esta que é fundamentalmente anti-evolucionária. Esta repentina injeção de uma alma imortal na linha de tempo, apenas na espécie humana, é uma intrusão anti-evolucionária no domínio da ciência. Portanto, afirmações como a de Gould de que a religião mantém-se longe do campo científico, restringindo-se à moral e aos valores é irreal.

É por isso que Dawkins afirma: "Um universo com uma presença sobrenatural seria um tipo fundamentalmente e qualitativamente diferente de um universo sem tal presença. A diferença é, inevitavelmente, uma diferença científica. Religiões fazem afirmações de existência, e isso significa afirmações científicas" (Ibid. Ibidem). Assim sendo, é fácil perceber que essa distinção dos objetivos da religião e da ciência e esse suposto pacto respeitoso são muito simplistas e não correspondem nem de longe à realidade.

A tese de Gould pode também ser muito criticada pelo fato de que para se manter restritos em seu magistério, os religiosos deveriam desistir da noção de milagre, que é uma violação das leis naturais pela vontade de Deus. Dawkins sabe disso e insiste nesse ponto:

Ou o corpo de Maria decompôs-se quando ela morreu, ou ele foi fisicamente removido desse planeta para o Céu. A assunção oficial da doutrina católica romana, promulgada recentemente em 1950, implica que o Céu têm uma localização física e existe no domínio da realidade física - como de outra forma poderia o corpo físico de uma mulher ir para lá? Eu não estou, aqui, dizendo que a doutrina de assunção da virgem é necessariamente falsa (embora, é claro eu acho que ela é). Eu estou simplesmente rebatendo a afirmação de que isso está fora dos domínios da ciência. Ao contrário, a Assunção da virgem é transparentemente uma teoria científica. Também o é a teoria que nossas almas sobrevivem à morte corporal, e também todas as histórias de visitações angelicais, manifestações Marianas, e milagres de todos os tipos. (Ibid. Ibidem)


Por fim, ele condena como desonesta e auto-servil a tática de afirmar que as crenças religiosas escapam do domínio científico, pois as religiões prosperam e conquistam um grande número de convertidos graças às suas histórias de milagres e promessas de vida após a morte. É claro que é precisamente devido ao seu poder científico que essas histórias têm o seu apelo popular, mas por outro lado, será considerado um golpe baixo submeter as mesmas histórias à uma crítica científica, pois serão considerados problemas de natureza religiosa e, portanto, fora do domínio científico. Mas a religião ou é uma coisa ou outra. Os apologistas religiosos não deveriam ter permissão de escaparem deste impasse tendo isso em ambos os jeitos. E muitos de nós, incluindo os não religiosos, deixamos que eles façam justamente isso.(1998)

Em conclusão, poderíamos dizer que a tentativa de unir a fé à razão, como muitos teólogos tem feito ao longo dos séculos, é falha, pois a razão pode voltar-se contra a fé, destituindo-a assim de todo o seu caráter de transcendência. Se a fé está divorciada da razão, as religiões passam a se fundamentar na sua fé, que é um fruto de suas experiências religiosas. As experiências religiosas são fenômenos indiscutíveis para as próprias religiões, e, portanto, as experiências de todas as religiões possuem a mesma autoridade e retornamos àquele velho argumento ateísta: se existem incontáveis religiões afirmando cada uma ser a única religião verdadeira, como poderemos demonstrar qual é a verdadeira dentre elas? A fé, além de não provar Deus, também serviria para justificar toda sorte de extravagâncias e absurdos irracionais imagináveis ? basta escolher o seu mito predileto e dar um ?salto de fé? pra justificá-lo. Outra constatação é que a separação e demarcação dos domínios da fé e da razão são razoáveis desde que a primeira não assuma nenhuma roupagem científica ou faça juízos de realidade. Assim, toda alegação religiosa que implique num juízo de realidade deve, obrigatoriamente, se curvar diante das descobertas científicas, o que não deixa de ser uma posição bastante curiosa e, acreditamos, inviável para muitas das religiões que conhecemos.

FIM
# posted by Delerue @ 12:53:00 AM  ::  




sábado, julho 03, 2004


Dando continuidade ao texto do Matheus.

A separação

Já no séc XIX, o pensador religioso Sören Kierkegaard (1813-1855), se volta contra essa conciliação. Para o pensador, quando nos envolvemos com tentativas de provar a existência de Deus ou mesmo entendê-la racionalmente, perdemos nossa fé e nosso fervor religioso. Assim como os fideístas, na França, ele não admite que se possa querer racionalizar a fé, pois a fé é feita de paradoxos e absurdos, como o de um Deus que se fez homem (1947). Na Idade Média expressava-se o mesmo pensamento com a expressão ?Credo quia absurdum? ? ?Creio porque é absurdo". Pois, se o Cristianismo tivesse realmente apelado à razão ele nunca seria uma questão de fé.

Se de fato essas questões de fé se acham além da razão, elas somente serão acessíveis através da revelação. A teologia, principalmente, se torna totalmente uma questão de fé, e decididamente divorciada da razão. E separados claramente os domínios da fé e do intelecto, as chamadas apologéticas cristãs perdem o seu valor. Será, portanto, perfeitamente justo rejeitar argumentos teológicos que se apóiam tanto na experiência sensorial como na ?iluminação divina?, pois argumentos e provas passam a pertencer exclusivamente ao campo da razão.

No entender de Kierkegaard, essa conciliação entre fé e razão, numa unidade isenta de contradições, é falha, porque se afirmamos que Deus pode ser firmado através de razões, demonstramos também que Ele de modo algum ultrapassa o entendimento, pois essas razões sempre estão ao alcance da razão. Se a existência de Deus pudesse ser comprovada logicamente, então Deus não seria realmente um ser transcendente. Ora, se a razão é limitada e Deus é um ser transcendente, crer nele será uma questão de fé, não de lógica.

Ou seja, Kierkegaard argumenta que se Deus ultrapassa a razão humana, não será por meio desta razão que argumentaremos a favor de sua existência. Por isso, o teísta erra ao defender sua fé com a razão, pois ele se baseia na fé: uma postura em que se aceita incondicionalmente determinada crença como verdadeira, sem dúvidas ou questionamento. Pois sendo a fé algo emocional, não necessitaria de razões para a sustentar.

Será necessário um ?salto de fé? para fundamentar a crença em Deus. Se a existência de Deus não pode ser estabelecida mediante prova lógica e nada pode ser firmado a Seu respeito através da razão, então acreditar em Deus, nas Suas qualidades, e em todo o sistema de dogmas acerca da imortalidade da alma e semelhantes, depende apenas da fé.

Definida essa ruptura entre fé e razão, partimos daí para conseqüências interessantes. Além de um estreitamento do alcance da razão, a crença em Deus assume completa independência com relação ao intelecto.

A união entre Filosofia e Teologia só irá perdurar ao se admitir que a razão pode, de alguma forma, apoiar ou fundamentar a fé. Porém, negando-se isso, não há mais espaço pra qualquer Filosofia no campo teológico. Separando a fé de qualquer vínculo possível com a investigação racional, a Filosofia retorna ao seu percurso secularista. Foi essa a posição dos sábios fransiscanos do séc XIV - como Guilherme de Ockham, por exemplo - que rejeitaram essa possibilidade e sustentaram que a razão e a fé eram incompatíveis, porque seriam fontes de verdades independentes, que não se sobrepõem nem entram em conflito. Cada qual, a razão e a fé, deve tratar de suas próprias questões sem se intrometer uma com a outra.

Disso tudo podemos deduzir que, tanto a Ciência, quanto a Filosofia não podem contestar os artigos de fé, visto que estariam ultrapassando seu campo de atuação no conhecimento. Da mesma forma, a fé não poderia pretender impor seus dogmas ao domínio da investigação racional pertencentes à Ciência e à Filosofia.

Essa radical separação permite que os homens mantenham suas atividades religiosas estritamente separadas das suas atividades racionais. E seria um equívoco de nossa parte considerar isso uma hipocrisia, pois muitos homens viveram, e ainda vivem, sem deixar as suas convicções práticas interferirem nas suas convicções religiosas.
# posted by Delerue @ 3:11:00 PM  ::